Avaliação Congresso de Estudantes do Estado de SP

Congresso da União dos Estudantes do Estado de São Paulo.

Estive no último congresso de estudantes de São Paulo, em Campinas, sai de lá preocupado, frustrado e decepcionado. Vou elencar os motivos que levaram a me sentir assim; entre 1988 e 1992 atuei em vários momentos no movimento estudantil, entre eles a campanha pelo impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Melo, digo isso com orgulho, pois tínhamos capacidade de pensamento, autonomia e lideranças carismáticas para congregarem ideais. Não eram todos que tinham esse carisma ou concordavam com tudo, mas conseguiam fazer parte de um grupo que queria fazer a diferença. Em outros momentos fizemos campanhas contra aids, solidárias e de conscientização relacionadas a drogas, fizemos parte de grupos de ação que pintavam, reformavam e lutavam por uma escola melhor. Atuei em dois grêmios, na UGES, em Guarulhos, em alguns momentos na UBES representando os grêmios. Na faculdade, na qual não consegui manter-me por falta de recursos financeiros, colaborei no trote filantrópico, com arrecadação de alimentos para comunidades carentes.

Coloco nesse contexto, não para buscar uma explicação anacrônica e sem sentido, mas querendo entender onde foi que deixamos de ser estudantes conscientes e centrados na construção de um futuro melhor para o país. Bom esclarecer que voltei a estudar hoje, após 15 anos fora das instituições de ensino, por contar com conquistas que, já naquela época, inseríamos em nossas reivindicações, como estudo gratuito e de qualidade e equipamentos do Estado em pontos estratégicos para proporcionar à população acesso às universidades públicas sem ter que viajar duas ou três horas para isso.

Nos dois dias que estive com a União dos Estudantes percebi claramente um reflexo da política nacional, lá era tão somente uma reprodução do que acontece no congresso nacional, na câmara dos deputados e nas eleições bianuais. Vi alunos de instituições privadas cooptados ideologicamente pela "situação" que gere a UEESP, sob o comando de um grupo pseudo-socialista que reivindica em seu nome atuar por um socialismo que em outros momentos foi propagandeado pelo PC do B, hoje base governista e sem ideologia e ideal socialista. A cooptação chegou a ponto de alguns não saberem exatamente do que se tratava aquilo de que estavam participando, convidados não para uma ação política, politizadora e conscientizadora, mas sim para uma viagem gratuita no fim de semana onde iriam ocorrer várias “baladas” e muita cerveja. Soube de atitudes, contadas aos montes, tanto pelos que estavam lá sem saber porque, mas também pelo grupo de oposição, onde nessa briga chegaram a ameaçar alunos e uns aos outros para conseguirem votos.

Essa idéia está claramente fixada de que quem manda é o grupo hoje na direção, a tal ponto de os espaços serem delimitados primeiramente respeitando a forma que eles (UJS) escolhem que seja feito, ou seja, no centro do ginásio é fechado como se fosse área restrita, inclusive com militantes da UJS controlando um pequeno portão para entrada exclusiva, onde não se vê pessoas realmente interessadas nas propostas, nem mesmo naquelas para que eles foram conduzidos para votar. A despolitização é tal que os garotos e garotas que lá estavam não perceberam realmente o que aquilo significava, fiz umas fotos que mostra isso, justamente na defesa da tese desse grupo, grande parte dos delegados lá naquele espaço aproveitava para brincar, tomar cerveja, fumar, criar figuras e chapéus com etiquetas e jogarem papeis e panfletos para o alto como se não existisse ali um grupo realmente preocupado com algo que lhes interessasse e ao conjunto da sociedade. A evacuação do ginásio, com poucas pessoas dada a proporção de representantes dos discentes do estado, após a votação, deixando os eleitos falando praticamente sozinhos, mostrou bem o tipo de política lá implementada; em alguns momentos percebi, antes da conclusão dos trabalhos, caixas de isopor sendo transportadas para dentro da área fixada prioritariamente como da UJS, a princípio, sendo informados pelos que transportavam como sendo cerveja, para uma comemoração esvaziada. Não bastassem as baladas, controladas e organizadas por essa direção, a demagogia barata das palavras da presidente da UNE, os discursos vazios e a falta de discussão séria em torno dos assuntos que dizem respeito ao movimento estudantil, tiveram vários recursos contra eleições e participação de delegados que não foram democraticamente eleitos, não foram sequer apresentados ao trabalho da entidade.

Degradante, acho que esse é o termo que mais se adequa aquela visão, pelo menos para uma pessoa adulta e que sempre lutou pela manutenção da democracia e, intransigentemente, mantêm postura nesse sentido. Talvez para aqueles jovens que ali se encontravam não exista nada realmente errado nisso tudo, talvez eles até estejam certos em aproveitarem todos os momentos de suas vidas para brincarem e se divertirem, talvez, sem saber, estejam inconscientemente já se preparando para o futuro que lhes é reservado. Futuro esse com poucas oportunidades, como mão de obra barata e meio especializada a ser fornecida pelo Estado às grandes corporações.

As incoerências eram tantas que as mesas para debates, inclusive com bons temas demonstraram intervenções inconsistentes, pobres, pequenas e sem nenhuma visão da realidade, pouquíssimos momentos de real aproveitamento do que era ali debatido ou das falas dos que pediam a palavra. O mesmo movimento que deveria ter dentro da sua missão e visão a defesa, sem concessões, da democracia, permite pessoas que se dizem diretores da instituição levantarem e dizerem que a oposição não deveria existir, pois com certeza a lavagem cerebral imposta àquela juventude não permite que ela perceba a burrice da unanimidade. Infelizmente a oposição também não detinha muitas condições de debate, demonstrou isso claramente nos grupos de debate, quando alguns deles, que deveriam defender o sistema de cotas e o acesso imediato ao ensino superior, não importando como seja - pregavam a cobrança a um Estado incompetente e que não tem em seus objetivos formar cidadãos - para que ele proporcione estudo de qualidade, como se os governantes fossem fazer, de uma hora para outra, um monte de faculdades e estruturá-las para a população. Incoerência essa que ouvi de uma aluna negra, pregar contra cotas raciais porque ela está, ao que parece, encantada com a democracia racial que só existe nos discursos da direita, nas mentes negras cooptadas, pela ignorância e sugestão psicológica imposta por pessoas que não querem um ensino para todos, querem manter sob jugo a população negra e inserir os filhos da elite, e somente eles, num mercado que não tem espaço para todos. Mas quando um negro entra por esse viés, torna-se um propagador barato da ideologia dominante e não tem consciência disso, facilitando assim o ataque a essa causa, funcionando como uma erva daninha num terreno de cultivo de boas culturas.

No geral, com toda as deficiências, trapalhadas, deturpações da luta e politicagens, não fica nada de realmente interessante no movimento estudantil atual, a não ser replicar com grande similaridade a política pequena e desconexa que temos nos poderes da república. Essa discrepância do que realmente deveria ser o movimento estudantil com o que realmente tem demonstrado ser, ficou claro até nos convidados para plenária, ver José Genoino num congresso para estudantes foi, no mínimo, usando uma palavra cuidadosamente escolhida para não ser grosseiro, deselegante. Junto a isso, a luta interna entre o PC do B e PT, torna essa instituição ineficaz, incapacitada e sem real valor de representatividade de classe ou de grupo.

As lutas estudantis nos mostraram que é possível fazermos diferença, que é possível, organizados, tornar esse país uma nação; que é necessário, porém, formação política, instrumentalização dos movimentos organizados, mas principalmente dos estudantes, onde nascem boas idéias e os ideais são colocados em prática, cabe a esse grupo uma missão de enfrentamento, contestação e contextualização da realidade política e social do Brasil. Em termos de enfrentamento, é obrigação dos estudantes retomar a defesa dos direitos, ir às ruas, fazer o enfrentamento do crime organizado que se tornou a classe política, em sua maioria; por contestação, entendo que os movimentos estudantis, por serem compostos por pessoas teoricamente preparadas ou em preparação para um melhor entendimento da realidade, deve ser também a voz da sociedade em relação ao Estado; e quando se fala em contextualização, falamos sobre a necessidade dos estudantes entenderem a realidade e mostrarem esse entendimento para a sociedade, levando conhecimento, debate e organizando, junto com as lideranças sociais, movimentos de reação à política e aos achaques aos cofres públicos;

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